Nesta edição da Confraria Entrelinhas continuamos com o gênero miniconto. Participaram Adriane Lazarotti, Cármen
Machado, Claudia Carvalho, Daniel Indalécio, Dóris Hupel, Enio Viana Filho e
Guima Beineke. Depois de diversas leituras e de animada rodada de discussões, a
confrade Dóris Hupel apresentou um miniconto de sua autoria e uma oportuna
observação: - Muitos minicontos, micro/nano, às vezes não passam de nadacontos!
Cármen Machado
trouxe estes de Edson Rossato:
1) Domingo:
abraços, lágrimas e sorrisos! Título mundial conquistado! Segunda-feira:
"Ô país de merda!"
2) CLASSIFICADO:
"Troco marido inútil, machista, bruto e traidor por rádio-relógio. P.S.:
Volto troco."
3) CLASSIFICADO:
"Alugo crianças para serviços externos. Oito a doze anos. Especialidade em
semáforos."
Três minicontos
de Jorge Timossi Corbani. Nasceu em Buenos Aires, Argentina, em 1936. É, hoje,
cidadão cubano.
A aranha
Ficou tão bonita
minha teia que já não desejo que caia em sua fúlgida trama nenhuma outra vítima
além de mim mesma.
Última função
A
Morte estendeu sua longa mão, roçou com um dedinho a corda bamba, e o
Equilibrista precipitou-se em seus braços, são e salvo, entre estremecidos
aplausos, sucesso que talvez demonstre que o Artista deve descartar de seus
atos toda rede de proteção, mesmo que seja, como neste caso, a última função de
sua vida.
Parênteses
(Aquele
escritor era tão respeitoso para com seus leitores que colocava tudo que
escrevia entre parênteses para que eles pudessem escolher (livremente) entre
lê-lo ou não, incorporar o texto completo ou tomá-lo como uma (simples)
intercalação, ou ficar só com os parêntese que (como se sabe) às vezes são
muito mais úteis na vida que na literatura).
Minicontos de confrades.
(Quem
ainda não mandou o seu, por favor providencie para que possamos publicá-los)
Estações
Era
outono. O farfalhar das folhas secas era um som presente durante o dia e a
noite. As árvores agora exibiam seus galhos nus e já era possível sentir o
rigor do inverno. O outono a deprimia,
passava horas calada, olhar fixo no vazio da vida. Quando a chuva beijava a vidraça, Sofia
chorava. Sentia-se amparada, quase acalentada pelos braços de uma amiga, quem
sabe a morte.
Claudia Carvalho
Sombra
Caminhava
passos alongados sobre o calçadão que parecia ondular junto com as águas do
lagorio. Sentiu agradável vertigem ao ter seu rosto acariciado suavemente pelo
calor do sol, que, ainda um pouco adormecido espreguiçava-se por entre as
torres dos morros da margem oposta, e projetava sua sombra saltitante ao seu
lado, a qual, ora subia num banco, ora numa pedra, encurtava ou espichava. Ele
diminuiu o passo para observá-la melhor. Viu-a enroscar-se na sombra das pernas
bonitas da caminhante por quem passava e teve a nítida impressão das duas
envolverem-se numa fusão voluptuosa de braços, abraços, pernas e uma bunda
meticulosamente malhada. Ele não notou que ela também reduzia seus passos, até
que finalmente deu-se conta que estava parado. Seus olhos encontravam-se a dois
palmos de alguém que lhe fitava sem expressão através das lentes escuras de um
Ray-ban. Universo congelado. Têmporas incendiadas. Nem vento, nem pássaros, nem
a água se movia. Se ao menos houvesse um botão de ejetar.
Guima Beineke